Demétrius: o procurador absolvido

Operações 7 de Ago de 2023

Saudações Povo Brasileiro,

Parece que há uma nova moda em nosso país: homens que cometem crimes, principalmente contra mulheres, estão logo em seguida sendo atestados com algum tipo de transtorno mental para justificar seus atos e assim evitar a prisão ou qualquer chance de pagar judicialmente pelo crime cometido.

O caso do procurador Demétrius Oliveira de Macedo tem diversas falhas, começando pelo fato dele não ser apto ao cargo em que atuava. Levando em conta um dos seus laudos psicológicos, ele demonstrou na avaliação que “não segue as normas e ordens disciplinares” e “tem muita dificuldade para relacionar-se com as pessoas e alguma vez nega-se a cooperar com os colegas e a chefia”. A prefeitura estava ciente dos seus comportamentos durante o desempenho do trabalho e, mesmo assim, não o afastou do cargo e nem estipulou medidas para conter a situação. Mas como no laudo seguinte ele repentinamente torna-se uma pessoa apta ao trabalho?

Outra falha que surge no decorrer do processo é a questão do medicamento. Tudo indica que ele tomava seus remédios regularmente, ainda que com uma dosagem baixa para o seu quadro de saúde “tão drástico” como tenta provar os laudos apresentados por sua defesa. Assim, pode-se afirmar que a agressão, classificada como “surto” por sua defesa, não veio pela falta de medicamento. Tudo indica que há uma manobra de seus advogados para mantê-lo em estado alterado e assim não cumprir pena detido na prisão, já que ele foi aconselhado a não tomar seus remédios durante seu tempo em cárcere.

Entenda o caso

Em junho de 2022, o Procurador Demétrius Oliveira de Macedo espancou sua chefe, a procuradora-geral do município de Registro, SP, ao tomar conhecimento do processo administrativo aberto por ela por conta de sua postura agressiva no ambiente de trabalho. A violência foi gravada por outra colega presente no momento e Demétrius foi preso preventivamente alguns dias depois.

O caso foi para justiça e Demétrius foi absolvido em março desse ano sob a justificativa de que não pode responder por seus atos por apresentar “esquizofrenia paranoide”, segundo laudo do IMESC (Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo), e, assim, foi encaminhado para internação na ala de psiquiatria do Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário em São Paulo. Em um dos documentos que vazamos hoje, consta a suspeita de que Demétrius tenha sido aconselhado a não tomar seus medicamentos para agravar a sua condição de saúde e assim que se configurasse a inimputabilidade. Além disso, também teria sido orientado a se comportar mal na prisão, a qual reportou que ele não obedecia às autoridades, faltava com respeito aos agentes e outros detentos, além de um episódio de descontrole que resultou na destruição da cela e de seus pertences.

Em atestado médico de dezembro de 2020 consta o CID (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde) F29 - Psicose não orgânica não especificada, um quadro a princípio transitório e que não configura um diagnóstico. Em relatório de maio de 2021, o médico atestou a remissão total dos sintomas com uso regular de medicação e considerou Demétrius apto para o trabalho.

Conforme veremos, talvez devesse constar no ASO (Atestado de Saúde Ocupacional) que ele era apto para trabalhar apenas com homens.

Segue abaixo o material que consta no processo:

Apto ao trabalho?

Desde 2012 já existiam registros que demonstravam a falta de capacidade de Demétrius para o trabalho, conforme imagens de sua avaliação de desempenho feita pela prefeitura de Registro, onde vemos problemas em seguir ordens e relacionamento interpessoal, entre outros:

Chamou nossa atenção que em 2022 ele foi considerado apto ao trabalho no exame médico periódico, e no ASO (atestado de saúde ocupacional) não há qualquer menção a CIDs ou doenças. O exame foi feito pouco antes do episódio de violência contra a chefe.

Aqui vemos que Demétrius tinha uma motivação para um ataque - ser alvo de processo administrativo disciplinar - que nada teria a ver com a alegada doença ou com um surto sem motivos aparentes, motivação essa que era uma consequência do seu comportamento machista e grosseiro com mulheres:

Faz diferença termos noção da violência das agressões de Demétrius contra a chefe, tanto que o MP o acusou de tentativa de feminicídio:

O processo administrativo foi aberto justamente para investigar o comportamento agressivo dele em relação a uma colega. Sua má conduta com colegas mulheres já era bem conhecida:

Avaliação psiquiátrica após a prisão

A conversa de Demétrius com o psiquiatra Dr. Guido Arturo Palomba, que o avaliou a pedido da defesa, em agosto de 2022:


Embora tenha afirmado que vinha sofrendo assédio moral por parte da chefa, Demétrius não demonstrou qualquer arrependimento pelo que fez, como podemos ver no trecho abaixo do relatório da avaliação psiquiátrica:

Ainda que tenha dito arrepender-se por ter infringido uma lei, mas não por ter praticado a agressão, é estranho alguém com seu diagnóstico ter uma noção tão clara para se arrepender de ter quebrado a lei. Ao mesmo tempo, não consegue se arrepender ou mostrar arrependimento de ter espancado a sua chefa, com a qual possuia anos de convivência. Demetrius se arrepende de ter sido pego, não de ter espancado uma mulher.

No mesmo parecer consta depoimento feito pela mãe dele, Emilia Onória de Macedo, inclusive ressaltando que em 2020 ele teve um surto violento que foi controlado com o uso da medicação.

Como podemos ver, a mãe de Demétrius confirma que ele estava estável. Inclusive, teve contato com o filho no fim de semana anterior ao crime, quando não apresentou nenhum sinal ou comportamento diferente.

Na cadeia

Demétrius ficou preso preventivamente de junho de 2022 a fevereiro de 2023, quando foi encaminhado para internação. Em mais de uma oportunidade os diretores técnicos da penitenciária reportaram formalmente aos juízes responsáveis as faltas disciplinares cometidas por Demétrius. Seus companheiros de cela reclamavam que ele estava faltando com a “urbanidade” (decência) e que não cumpria com deveres de higiene, posto que não tomava banho nem lavava suas roupas. Ele xingou agentes de segurança, chutou a porta da cela, atirou seus pertences para fora, bem como a cuba da pia do banheiro que ele mesmo quebrou. Em outro momento precisou ser imobilizado para que conseguissem aplicar a medicação injetável.

O médico psiquiatra da prisão, Dr. Leandro Camille Gavinier, relatou em seu depoimento que Demétrius foi instruído a não tomar seus remédios até a realização da avaliação psiquiátrica que seria feita pelo IMESC, segundo relato de seu irmão, Vinícius:

No prontuário pessoal do detento, feito ao entrar na prisão, ele nega a doença e uso de medicamentos:

A justiça solicitou avaliação psiquiátrica para determinar se houve incidente de insanidade mental na agressão cometida por Demétrius contra a chefe. A avaliação ocorreu em 12/12/22 no IMESC - Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo - e atestou a esquizofrenia paranoide:

O incidente de insanidade mental é instaurado sempre que houver dúvida sobre a saúde mental do acusado e para verificar se, à época dos atos, ele era ou não inimputável. Inimputável é uma pessoa que, por doença psíquica ou incapacidade, não pode ser punida conforme o processo de execução penal. Independentemente disso, o Ministério Público pede que o caso vá a juri popular.

Com base no resultado da perícia, a justiça absolveu criminalmente Demétrius e determinou medida de segurança (internação) por, no mínimo, 03 anos, salvo deliberação em sentido contrário ou avaliação criteriosa do hospital de custódia. Depois dos 03 anos, será reavaliado anualmente para ser verificada sua condição de retomar a liberdade. Conforme previsto no Código de Processo Penal, o juiz mandou a sentença para o 2º grau - TJSP.

De modo geral, casos que envolvam transtornos mentais são julgados conforme o uso de medicação, pois se a pessoa estava tomando medicamento ou não tomou de propósito, ela segue imputável, o que parece ser o caso de Demétrius. A inimputabilidade é somente garantida aos indivíduos que não tenham noção dos seus atos. Doenças mentais não induzem as pessoas a cometerem crimes!

Enquanto o caso segue, nós podemos pensar:

  • Com o comportamento apresentado por Demétrius ao longo dos anos, como a prefeitura não viu a necessidade de agir de forma preventiva? Sua omissão contribuiu para que uma mulher fosse agredida gravemente e quase morta.
  • Como ele pode ser considerado capaz para assumir a responsabilidade do cargo de procurador do município, mas incapaz para responder criminalmente pela tentativa de matar sua chefe?
  • A seletividade no comportamento de Demétrius aponta seu ódio às mulheres para além de qualquer problema de saúde mental que possa ter.

A Comissão Mulheres e Questões de Gênero do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG), citada na pesquisa do NUPEGRE de 2020, aponta dois grandes problemas com relação ao incidente de insanidade mental nos crimes de feminicídio: a retirada da dimensão socioestrutural desses crimes e a estigmatização de pessoas com transtorno mental, como se fossem a elas inerentes ou esperadas condutas de violência contra a mulher.

É sobre a dimensão socioestrutural que queremos chamar atenção para que fique cada vez mais evidente que a violência contra a mulher, nas suas diferentes formas, é uma questão de poder e não de sanidade mental dos indivíduos que a praticam. Basta lembrarmos que há apenas 2 anos o STF proibiu o uso do argumento de “legítima defesa da honra” na defesa de feminicídios.

Hoje, 07 de agosto de 2023, faz 17 anos que a Lei Maria da Penha foi aprovada. E aqui, cabe uma reflexão: criminalizar uma conduta sem reestruturação social, não resolve o problema e serve como política de encarceramento em massa. Ao analisarmos os índices de violência contra a mulher nos últimos anos, podemos observar que o número de casos não diminui.

É muito cômodo para a população masculina continuar cometendo crimes contra às mulheres, uma vez que como visto não há consequências, ou, quando existem, são muito pequenas. É URGENTE a mudança dessa realidade ou continuaremos a testemunhar o massacre, já que 03 mulheres são vítimas de feminicídio POR DIA no Brasil, segundo dados do Anunário Brasileiro de Segurança Pública.

Saiba mais sobre a Lei Maria da Penha.

Para denunciar: Ligue 180 ou denuncie pelo Whatsapp: (61) 99610-0180

Procure também a Casa da Mulher Brasileira ou o Centro Integrado de Atendimento à Mulher (CIAM) de referência, mais próximo. Você também pode procurar o Mapa do Acolhimento que realiza atendimentos jurídico e psicológico gratuitos.

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